
A gente se beijou e foi então pra um daqueles bares que têm ali por perto, na Trajano. Chegamos lá e tinha uma bandinha ruim tocando um som que era uma verdadeira bosta, não sei pra quê enfiar aqueles caras no porão, com meia-dúzia de gatos-pingados prestando atenção naquela microfonia irritante. Pra nossa sorte, logo pararam e um dj colocou um som mais esperto. A gente encontrou uma porrada de gente conhecida por lá, inclusive uma ex-namoradinha minha – a Rita não sabia. Ah, uma guria muito gata, mesmo que os meus amigos a achassem indie demais – o que eles pensam da Rita também. Grande merda, eu curto guria assim, que tem o mesmo estilo que eu. A pequena até me cumprimentou, mas pra mim, fodam-se todas as outras, a Rita é que me importa.
A gente foi bebendo umas e outras, conversando com uns perdidos da faculdade que a gente encontrou e com outros conhecidos da noite, e fomos dançar uma dos Strokes que era a nossa música. Como uma dessas músicas de casais, sabe? Todo casal tem sua música romântica, mas a nossa nem era. Ela tinha marcado porque bem naquela época em que a gente estava se conhecendo, fomos ao James e tocou por lá. O refrão dizia “por que você não vem até aqui? Nós temos uma cidade para amar”. Naquela hora eu puxei forte a Rita e dei um beijo com um tesão que fazia tempo que eu não sentia. Depois ela me disse que parecia cena de filme, pela cara que eu fiz, por minha atitude, pela circunstância, pelo jeito que o mundo se desfocou em volta de nós. E daria uma boa cena de filme sim. Esta noite, a música já não tinha a mesma entonação cênica, mas a emoção é a mesma.
Logo depois o Jorge chegou. O cara é meu irmão, melhor amigo, companheiro de vida boemia, mas também dos momentos mais foda. Só ele entende algumas coisas e às vezes eu faço o papel de seu conselheiro também. Ele estava putamente feliz porque havia feito uma apresentação naquela tarde que rendeu vários convites para outras apresentações e aulas para os próximos meses. Ah, sim, ele é pianista de um talento inexplicável, mesmo ainda sendo estudante. Sei que daqui a uns tempos estará fora do país, onde vai ser mais reconhecido que aqui. E foi esse meu grande parceiro que me convenceu a ir num curso muito chato sobre arte barroca na faculdade naquela tarde em que conheci a Rita. A Rita, sempre ela. Já percebeu que qualquer assunto sempre acaba na Rita? Ela disse que ia pegar uma cerveja no bar e já voltava.
Eu e o Jorge começamos numa pira de conversa sobre como algumas sutilezas da música antiga estão em um limbo de esquecimento hoje em dia e viajamos no tempo. Quando percebi, já tinha se passado meia-hora e nada da Rita voltar. Fomos para o bar e ela estava ali, toda sorrisos e olhinhos para o cara que trabalhava ali. Eu cheguei perto, pegando na sua cintura, num gesto daqueles tentando marcar terreno, dizendo que ela já tinha um homem, pro cara já se ligar. Me beijou rápido e disse “Pê, esse cara é uma figura, faz Belas também!”. Apertamos as mãos e ele só falou “Vado”. Eu acenei com uma cara de poucas amizades e acho que a Rita percebeu a tensão, me puxando pra pista. Eu nem sou um cara ciumento, só não gosto quando tem macho querendo bicar na minha área. Mas logo eu esqueci e a gente já se pegava naquela pista pequena. Não demorou pra irmos embora.
No dia seguinte, a gente nem se viu. A Rita ia visitar a avó dela, que não passava muito bem, e fazer um programa mais familiar. Eu fiquei na minha, em casa, lendo o livro que ela havia me dado. Muito bom, por sinal. A semana que começou, nem se fala. Mal nos vemos. Estávamos em semana de provas, eu tinha uma tela pra entregar, a Rita atrasada com uma xilografia. Foi na quinta que tomamos um café no fim da tarde e ela me convidou pra ir ao mesmo bar do sábado. Eu não podia, realmente, estava atrasado com a tela, tinha prova de história da arte no dia seguinte e não sabia muita coisa, por tanto faltar. Disse pra ela ir com a Fer, a amiga dela da Belas, sossegada, na boa. Ela me sorriu e deu um beijo antes de partir pra casa. Sábado a gente poderia ficar o dia inteiro juntos.
Cheguei em casa às sete e fiquei até as onze, trabalhando com o som alto, ouvindo um disco da Cecilia Bartoli que o Jorge havia gravado pra mim. Eu não sei o porquê, mas ouvindo árias de ópera o meu trabalho flui, eu me entrego num êxtase criativo que culmina numa sensação quase orgástica ao ver o resultado. É tão bom quanto estar com a Rita. A Rita, mais uma vez. Pensei nela, pensei na minha tela, em que tinha conseguido dar uma boa avançada, e achei que poderia fazer uma surpresa a ela. Me troquei e fui ao bar. Com pouca grana no bolso, tive que ir a pé, correndo os mesmos riscos corriqueiros de andar no centro de Curitiba à noite. Desci rapidamente as escadas e olhei por cima a procurando. O lugar estava bem cheio, a banda de jazz que toca às quintas já tirava um som nervoso, e eu me sentia eufórico pra encontra-la. Caminhei em direção ao bar e lá encontrei a Fer. “Pê, tu veio, querido”. “É, vim fazer uma surpresa pra Rita”. “Vai lá fora que ela tá lá no barzinho ao lado do caixa”. Lá fui eu, empurrando e afastando as pessoas que se amontoavam naquele inferninho. Tinha bastante gente lá fora também, e de andar tão rápido, e de estar tão eufórico, meu coração batia mais forte. E por ver o que eu vi, meu coração quis parar. Ali, num canto, a Rita beijava o tal do Vado, enquanto a mão dele escorregava em direção à sua bunda. Maldita Geni!
5 comentários:
Uhuuuuuuuuu
Aeeeeeeeee
Publicou aqui é!
Esse eu já tenho,agora espero o restante!
Abração guri!
Caaaaaaaaaaaaaaaara! que história interessante!!!!
Sei lá se este cara da história é vc, mas que ta boa, ta!
beijo!
adorei o novo espaço!
Gisele
hahaha, adorei o conto rsrs!!
meio trágico no final, mais enfim a realidade do escritor parece ser totalmente inversa rsrs e isso explica o que a Gisele perguntou heheh
BJO
Bem escrito e inteligente...
"Joga pedra na Geni..."...
Mt bom, fiquei com vontade de ler mais! Publica mais!!
Saudades primo! Mil bjs, Fer :""
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