domingo, 13 de maio de 2012

Para quem só gosta de auto-retrato

Outro dia, em São Paulo, saí com um grupo de quatro pessoas, das quais eu só conhecia uma. Quando perguntei onde íamos, uma das pessoas que eu não conhecia me respondeu: “vamos a um restaurante bem legal, um lugar super diferenciado“. Fiquei sem saber exatamente o que a resposta queria dizer, mas fui ao tal “lugar diferenciado” com o espírito aberto. Tratava-se de um restaurantezinho, em um bairro rico de São Paulo, cuja entrada discreta se notava pela movimentação de manobristas ocupados em receber uma fila de carros importados. Antes de entrarmos, notei três seguranças de óculos escuros, falando em walkie-talkies e vestidos de terno e gravata pretos, apesar do calor. No interior, todo mundo parecia ser da mesma família. Até nos olharam para ver se nos reconheciam de algum lugar. As mulheres tinham os cabelos lisos e joias e carregavam, além de óculos escuros, bolsas de couro desproporcionalmente grandes penduradas no braço. Os homens, por sua vez, estavam bronzeados e usavam camisas sociais bem passadas, enfiadas para dentro das calças. Muitos dos que tinham cabelos usavam gel. Todos comportavam-se como se estivessem em um clube. Ouvi alguém falar: “aqui só tem gente bonita!“ No cardápio do bar, além das caipirinhas de frutas variadas (lima da Pérsia, tangerina, morango), os mesmos drinks que se encontram em qualquer lugar do mundo. Alguém na nossa mesa pediu um Prosecco. No cardápio de comidas, palmitos (pupunha), raviólis de mussarela (de búfala) e tiramisus, com os quais as pessoas pareciam se deleitar. Eu entrei na onda e me deleitei também. No entanto, para o que era “diferenciado”, não havia nada de novo. A única coisa original eram os preços: fora de proporção, mesmo para quem mora em Tóquio, como eu. Na semana seguinte, fui a  um almoço de trabalho com uma conhecida que me disse que me levaria a um lugar em que “só havia gente bonita.” Devo confessar que tive certo receio de não ser bonito o suficiente e de acabar barrado na entrada do lugar. No entanto, ia convidado e não queria interferir nos planos de minha anfitriã. Se não me deixassem entrar, paciência. Para minha surpresa, o restaurante a que ela me levou parecia a filial do outro da semana anterior. Os mesmos carros importados, a mesma tropa de manobristas e os mesmos seguranças. A mesma caipirosca de lima da Pérsia. O mesmo palmito pupunha (na brasa) e os mesmos raviólis de mussarela de búfala (com molho de tomate e manjericão). As pessoas também pareciam as mesmas, e os preços astronômicos, idem. Ao longo da refeição, pensei ouvir umas duas vezes a palavra “diferenciado”. Também acho que entreouvi alguém dizendo “aqui só tem gente bonita”. Nos dois restaurantes, os cenários e os personagens se repetiam: mulheres de cabelos lisos com óculos escuros e homens bronzeados com a camisa para dentro das calças ocupados em ser elegantes sob um ar condicionado fortíssimo. Pensei na Val Marchiori, daquele seriado Mulheres Ricas, no qual tudo tinha grife e nada surpreendia, cuja personalidade se escorava em catálogos de lojas da Quinta Avenida. Entre um e outro copo de água (San Pellegrino), cheguei à conclusão de que as pessoas gostavam de ir a lugares diferenciados para não terem surpresas, para só verem pessoas iguais. Alexandre Vidal Porto Fonte: http://bravonline.abril.com.br/blogs/elemento-estrangeiro/

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